A pureza de Maria não é uma herança genética natural herdada de pais ou antepassados, mas uma intervenção Divina singular. Essa graça extraordinária de Deus, isentou Maria do pecado desde a sua origem, na concepção, antes que a condição do pecado a atingisse. Ela foi preservada de corpo e alma sem mácula para sua missão única e celestial: ceder seu ventre e sua carne para a formação da humanidade do Verbo Encarnado, ligando-o à linhagem ancestral do Rei Davi:
“Ouvi, agora, ó CASA DE DAVI! É pouco, para vós, fatigardes os homens, senão que também fatigueis ao meu Deus? Portanto, o mesmo Senhor vos dará um sinal: Eis que A VIRGEM conceberá, e dará à luz um filho, e será o seu nome Emanuel. (Isaías 7: 13 e 14)”
“O Senhor FEZ A DAVI UM JURAMENTO, de que não há de se retratar: “Colocarei em teu trono um DESCENDENTE de tua raça. " (Salmos 131, 11)
Essa preparação da Virgem foi absolutamente necessária para assegurar que Cristo nascesse livre de qualquer risco de estar sujeito à imperfeição moral, que é a condição humana de todos que nascem da humanidade vinda de Adão. As Escrituras atestam essa condição universal:
"Salmo 51:5: 'Eis que nasci na culpa, minha mãe me concebeu no pecado. Como, pois, seria justo o homem perante Deus, e COMO SERIA PURO AQUELE QUE NASCE DA MULHER? (Jó 25. 4 e 6)”
Ser concebida sob a sujeição ao pecado não significa que a pessoa comete o ato pecaminoso no ventre materno. Significa, antes, que a pessoa é concebida e nasce com uma natureza decaída, propensa e inclinada à corrupção, à imperfeição moral, à concupiscência (inclinação para o mal) e despida da graça santificante original. É uma condição existencial herdada da desobediência adâmica, que coloca o ser humano em um estado de necessidade de salvação.
Pela graça de Deus, Maria foi isentada da condição de ser concebida e nascer com sua natureza humana decaída. Essa salvação antecipada é expressada pela própria Virgem no ‘Magnificat’, onde ela reconhece humildemente a necessidade da intervenção divina em sua vida, não para purificar do pecado cometido ou da condição de pecadora adquirida, mas por preservar aquela que cederia sua carne para conceber e gerar o próprio Deus que a partir de sua concepção e geração, agora vive na carne – Jesus Cristo:
Lucas 1:47: "E O MEU ESPÍRITO SE ALEGRA EM DEUS, MEU SALVADOR."
Ao proclamar Deus como seu Salvador, Maria atesta que Ela também foi objeto da Redenção por causa de Cristo, e em Cristo. Sua salvação, contudo, foi realizada de modo singular e preventivo, preservando-a da mancha do pecado original, coberta de uma graça (favor) plena desde sua concepção, para que pudesse ser a morada pura do Verbo que edificou no meio da Virgem, em seu ventre imaculado, o seu Altar:
"De longe me aparecida o Senhor: “AMO-TE COM AMOR ETERNO, E POR ISSO A TI ESTENDI O MEU FAVOR. RECONSTRUIR-TE-EI, E SERÁS RESTAURADA, Ó VIRGEM DE ISRAEL!” (Jeremias 31:3-4)
“ALEGRA-TE, CHEIA DE GRAÇA, O Senhor É CONVOSCO!”(S. Lucas 1, 28)
“ALEGRA-TE e rejubila-te de todo o teu coração, FILHA DE JERUSALÉM! O SENHOR REVOGOU A SENTENÇA PRONUNCIADA CONTRA TI, E AFASTOU O TEU INIMIGO. O Rei de Israel, que é O SENHOR, está NO MEIO DE TI; NÃO CONHECERÁS MAIS A DESGRAÇA.” (Sofonias 3: 14 e 15)
Convinha, portanto, que apenas em Maria Santíssima o ciclo da transmissão da natureza pecaminosa fosse interrompido, em função direta da Encarnação de Cristo.
Se a condição de pecadora da Mãe não poderia ser transmitida a Jesus, então, logicamente, essa condição também não poderia ter sido recebida por Ela em sua própria concepção.
Maria foi o escudo que Deus concebeu e utilizou para proteger e manter incólume a Humanidade do Seu Filho Divino. Essa verdade estava prefigurada nas Escrituras, como um ato da providência Divina:
"Até quando andarás errante, ó filha rebelde? Porque o SENHOR CRIOU UMA COISA NOVA SOBRE A TERRA; UMA MULHER PROTEGE A UM VARÃO." (Jeremias 31:22)
Essa "coisa nova" – uma mulher que protege um varão – é a condição de Maria, redimida por antecipação e concebida na pureza por uma graça extraordinária e plena de Deus. Isso visava resguardar a santidade do corpo de Cristo de ser contaminada pelo pecado herdado da Mãe.
O capítulo 31 de Jeremias está inserido no "Livro da Consolação" (Jeremias 30-33).
O profeta anuncia um futuro de restauração (figura da reconciliação com Deus pela salvação) após o exílio (figura da condição humana afastada de Deus), no qual Deus estabelecerá uma Nova Aliança com Seu povo (Jr 31:31-34), reconstruindo a Cidade Santa de Jerusalém (figura de Maria, a Virgem obediente sem mácula ou corrupção), que tomaria o lugar da antiga Jerusalém corrompida (figura de Eva, a virgem antes imaculada, mas que por sua desobediência se corrompeu), e onde a Lei Divina do Amor será escrita no coração.
A expressão hebraica para “coisa nova” é Boreh Hadashah (בָרָא חֲדָשָׁה), que significa um ato de Deus sem precedentes, criado ex nihilo (do nada), sem correntes ou ligações com qualquer condição anterior, quebrando um ciclo natural e contínuo.
A condição de pureza singular de Maria baseia-se na ideia de que, por causa de Jesus Cristo, obrou-se nela uma inversão ou superação da ordem natural e da desobediência original (o pecado):
Nesta profecia, é a “mulher” quem está “protegendo” ou “cercando” o “varão”. Na ordem natural, o homem (Adão) foi o primeiro a ser formado e, por extensão teológica, caberia ao homem proteger a mulher. Ao dar à luz o Messias sem a intervenção de um pai humano e sem a mácula do pecado original, Deus formou Maria para “cercar” Jesus de uma humanidade pura, "protegendo" Sua Santidade Divina da corrupção herdada da carne.
O “Varão” é Aquele que virá para redimir o povo. A “coisa nova” é que o instrumento pelo qual esse Varão (Cristo) toma para Si a natureza humana já santificada na pureza carnal decorrente da obediência da Mulher (Maria).
Maria, a Mulher, foi o “escudo” criado por Deus para resguardar que a natureza humana de Cristo não fosse formada sob a égide do pecado.