No princípio, Deus criou os céus e a terra. (cf. Gênesis 1,1). Embora único, Deus não estava sozinho, pois, no ato da criação, seu Espírito pairava sobre as águas. (cf. Gênesis 1,2). Contudo, o Deus Criador e o seu Espírito, unidos sem divisão ou confusão, também não estavam sós. O Evangelho de São João nos revela que "no princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus." (João 1,1). E tudo foi feito por Ele, e sem Ele nada teria sido feito. (cf. João 1,3).
Mas, como podem outras duas Pessoas Divinas proceder da Pessoa do Criador, unidas a Ele sem divisão ou confusão?
Deus Pai é a Sabedoria única, não criada , posto que eterna.
Sendo Ato Puro, não possui composição de matéria ou forma, e por isso seus atributos são sua própria essência. Ele se revela a Moisés dizendo: "Eu sou o que sou." (Êxodo 3,14).
Sendo a Sabedoria em Pessoa, Ele interage consigo mesmo através do Conceito Intelectual que faz de si próprio, e que se expressa numa Imagem.
Nesse conceito intelectual que gerou uma Imagem mental que Deus possui de si mesmo, do que Ele É, temos então a Pessoa do Filho, que é "Imagem do Deus invisível" (Colossenses 1,15), tornada visível na Encarnação do Verbo.
Como o próprio Cristo afirmou: "Quem me vê, vê o Pai," pois "Eu e o Pai somos um." (João 14,9; 10,30).
Essa Imagem não é mera semelhança; ela é tão fiel, perfeita, completa e autêntica que nada lhe falta do seu modelo.
Como ensinou Santo Hilário, em sua obra 'Tratado sobre a Santíssima Trindade', a imagem é "a espécie que não difere do seu exemplar.' Logo, o Filho procede do Pai por Imagem de perfeição (identidade idêntica), e não por simples semelhança relativa.
Ele procede do Pai porque, sendo a Imagem, não pode proceder de si mesmo, mas do Modelo ou Exemplar.
Como nos ensina Santo Agostinho, "só o Filho pode ser Imagem do Pai" (De Trinitate, Livro IV, cap. 2).
Sendo a Imagem Divina a extensão perfeita e fiel de Deus, nada a distingue do Modelo.
A Imagem é, portanto, uma Pessoa Divina da mesma natureza e essência substancial de Deus Pai, que por meio D'Ela manifesta em unidade indivisível de ações, a sua vontade, o seu intelecto e o seu Poder.
A Epístola aos Hebreus confirma que o Filho é "o resplendor da glória (de Deus) e a imagem do seu ser" (Hebreus 1,3).
Santo Tomás de Aquino, por sua vez, afirma que sendo " verdadeira Imagem há de necessariamente proceder de Outro," (Suma Teológica, art. 1º Q 35, Livro Ia).
Já que Deus é eterno, Ele possui desde sempre o conceito intelectual de si próprio, no qual gera sua Imagem.
Se o Modelo é eterno, também é eterna a imagem que Dele é gerada. Por isso, existe uma relação eterna e pessoal entre o Modelo (Pai) e a Imagem (Filho), e vice-versa.
Somente sendo uma Pessoa Divina, o Filho pode ser a Imagem fiel de outra Pessoa Divina.
Diante disso, é correto afirmar que a Imagem fiel e perfeita de Deus é uma identidade pessoal, pois Pessoa também é o Deus Criador.
A Imagem é Pessoa.
Mas, se Deus Criador tem uma Imagem perfeita de si desde sempre, Ele também ama essa Imagem desde sempre, pois, como nos diz a Escritura, "Deus é Amor." (1 João 4,8).
O Pai ama o Filho porque ama a si mesmo, assim como o Filho ama o Pai, e é por esse amor que existe uma ligação profunda e definitiva entre as Pessoas Divinas.
O Amor que une o Modelo (Pai) e a Imagem (Filho) é tão absolutamente perfeito que também consiste em outra Pessoa Divina: o Espírito Santo. Ele é a Personificação do Amor entre o Pai e o Filho. Nesse Amor, a vontade, os atos, o poder e o intelecto do Pai e do Filho se manifestam sem divisão, mas em unidade. Sendo esse Amor, Divino, logo, o Espírito Santo é também uma Pessoa Divina. E esse amor se expande para nós, pois "o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado." (Romanos 5,5).
O Espírito Santo de Deus é a manifestação Personificada do afeto amoroso do Pai pelo Filho, e vice-versa. E procede tanto do Pai quanto do Filho, pois é a manifestação conectiva do afeto e da dileção entre Eles. Esse Elo foi testemunhado no Batismo de Cristo: "o Espírito Santo desceu sobre Ele em forma corpórea, como uma pomba; e veio do céu uma voz: Tu és o meu Filho Bem-amado; em ti ponho minha afeição." (São Lucas 3,22).
O Espírito Santo, chamado "nexo entre o Pai e o Filho" por Santo Tomás1, é uma Pessoa Divina à altura de ligar as outras duas Pessoas Divinas.
Se Deus é eterno, assim como Sua Imagem, o Amor que lhes une também é.
As Três Pessoas da Trindade são eternas, e, embora distintas, possuem a mesma essência divina, e por conta disso, Elas podem se ligar sem confusão e se distinguir sem separação.
1 Suma Teológica, Q 43, art. 1º Livro Ia.