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Por Que o Predestinado É Salvo Sem Perder Sua Liberdade?


 A predestinação não anula o livre arbítrio. Deus, em Sua Presciência (conhecimento de todos os futuros), elege infalivelmente alguns santos para a glória eterna. Contudo, Ele não viola moral ou psicologicamente a vontade desses eleitos. Deus deseja que todos os seres humanos sejam salvos, pois Ele os ama. A perdição, portanto, não vem d'Ele, mas do próprio ser humano:

"A tua perdição, ó Israel, vem de ti. (Oseias 13, 9) " 

Deus quer que todos os homens sejam salvos. (1 Tm 2, 4)" 

"O povo insensato lança-se a perdição. (Oseias 14: 4) ”

 Atingir a vida eterna, no entanto, implica rejeitar o mal e aderir livremente à Sua vontade. A verdadeira liberdade consiste em nos movermos espontaneamente em direção ao Bem que só Deus pode realizar em nós. 


Capítulo I: A Perfeição da Escolha Livre E o Chamado Irresistível ao Predestinado. 

 O Livre Arbítrio é a faculdade da razão e da vontade que nos permite escolher entre o Bem e o mal. Originalmente, a liberdade era apenas a escolha entre vários bens. Pela desobediência de Adão, essa liberdade se perverteu, permitindo a escolha do mal. O pecado não é obra de Deus. Ele nasce da desordem da liberdade que, sem freios, leva o homem a desejos insensatos e nocivos. O julgamento de Deus é justo, pois premia os justos que se conduziram espontaneamente ao Bem e condena os maus que, pela própria vontade, abandonaram a Deus. 

  • A Punição ou Recompensa Injusta: Se o homem não fosse dotado de vontade livre, o castigo e a recompensa seriam injustos 7.
  • O Dom da Liberdade: A conduta humana não seria pecado nem boa ação se não fosse voluntária 14. A Igreja Católica, no Concílio de Trento, rejeita a teoria dos que dizem que o livre arbítrio se perdeu ou se tornou uma ficção após o pecado 12.

Capítulo II: A Predestinação como Graça Eficaz

 Deus realiza Seus propósitos nos seres humanos pela Providência (regra geral) e pela Predestinação (misteriosa exceção) 8.A Predestinação é a atuação de Deus em Sua Presciência (poder de prever todos os futuros). Deus antecipa a salvação daqueles que Ele sabe que estarão perfeita e incondicionalmente dispostos a recebê-Lo, e em nenhum momento da vida duvidarão de Deus ou oscilarão na fé 9.

O Chamado é Aprazível, Mas Não É Coercitivo: 

  • Atração Estimulante: Deus atua no eleito para que ele O queira com arrebatador ardor na alma, fazendo-Se desejável de modo irresistível e mediante um impulso irrenunciável 11.
  • Criação de Circunstâncias: Deus não coage tirando do eleito a vontade, mas cria ao redor da vivência humana os fatos e experiências que, como agentes externos, atrairão e ordenarão inevitavelmente a vontade do eleito a vê-lo de maneira mais clara em toda sua beleza e perfeição, e isto o instiga irresistivelmente a buscar e alcançar a salvação.
  • Causalidade Mútua: Deus é a Causa Primeira e Principal da predestinação. Ele atua em conjunto com a livre vontade humana, que é a Causa Secundária e coadjuvante 13. A força maior de Deus atua para que a força menor do ser humano participe desse nobilíssimo movimento rumo à salvação:

"Aliás, sabemos que todas as coisas CONCORREM para o bem daqueles que amam a Deus, DAQUELES que são os ELEITOS, segundo os seus desígnios. Os que ele distinguiu de antemão, também os predes­tinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que este seja o primogênito entre uma multidão de irmãos. E aos que predestinou, também os chamou; e aos que chamou, também os justificou; e aos que justificou, também os glorificou. (Romanos 8: 28 -30) 

A salvação, para o predestinado, é um efeito certo da predestinação, e o Bem que ele fará no futuro é a finalidade pela qual Deus o elege, e não a causa de Sua escolha 10. 


Capítulo III: A Providência e o Risco da Queda nos Não Predestinados.

 Nos não-eleitos, Deus age pela Providência, naqueles que Ele anteviu que teriam uma vontade dúbia e oscilante. 

  • Possibilidades Amplíssimas: Deus move os não-eleitos e providencia condições eficientes para a salvação, mas sem criar neles uma apetência irresistível à bondade, pois se há na alma desse indivíduo, dúvida ou oscilação, essa apetência implicaria coação. A salvação fica, neste caso, à mercê da livre escolha.
  • Resistência à Graça: O ser humano pode livremente repudiar a ação da Providência, resistir ao Espírito Santo 18, ou até mesmo cair na apostasia 19. O Concílio de Trento rejeita a teoria dos que dizem que o indivíduo "não pode discordar, mesmo se quiser" da Graça 20:

"Ora, Efraim transviou-se e Israel maculou-se; (Oseias 5, 3)"  

  • A Culpa é Humana: A falibilidade da não-salvação não pode ser imputada ao Salvador, mas tão somente à vontade livre do indivíduo 21.

 "Deus não é o autor da morte, a perdição dos vivos não lhe dá alegria alguma. (Sabedoria 1, 13)"

  
A Igreja Católica, ao manter o equilíbrio entre a Soberania de Deus e a Liberdade de Escolha, assegura que a salvação é um dom de Misericórdia Divina que exige a cooperação da vontade humana, a qual é essencial para a justiça da recompensa. 


Referências:

  1. Sabedoria 1, 13; Oséias 13, 9; I Timóteo 2, 4.
  2. I Timóteo 6, 9.
  3. Deuteronômio 11, 26, 27 e 28.
  4. Romanos 7, 18 e 19.
  5. AQUINO, Tomás. Suma Teológica. Q 83, Art. 1º.
  6. I Coríntios 12, 6.
  7. AGOSTINHO. Do Livre Arbítrio. Cap. 12, Cap. 14.
  8. Romanos 8, 28-30.
  9. MOLINA, Luís de. Concórdia. d. 26, 15, p. 170.
  10. Efésios 1, 3, 4, 5 e 6.
  11. Romanos 9, 11 e 13.
  12. CONCÍLIO DE TRENTO. Cân. 5; Cân. 4.
  13. DAMASCENO, João. A Fé Ortodoxa. l. cap. II.
  14. Eclesiástico 15, 14.
  15. Sabedoria 14, 3; Atos dos Apóstolos 24, 2.
  16. Josué 24, 15.
  17. Hebreus 10, 36; São Mateus 24, 13.
  18. Atos 7, 51.
  19. Oséias 4, 14.
  20. Hebreus 6, 5.
  21. São João 6, 45.
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